Livro - Du mode d'existence des objets techniques. Paris: Aubier, 1989.
O filósofo francês Gilbert Simondon, no livro Du mode d'existence des objets techniques, aponta questões importantes no que diz respeito às relações do ser humano com o mundo à sua volta; inicia pelas definições dos tipos de pensamento humano, como o pensamento mágico, e seus desdobramentos, pensamento religioso, artístico e científico.
Simondon trata das técnicas, desde a invenção, aos processos de produção industrial e a seguir sobre as relações que o ser humano estabelece com as máquinas. Relações de trabalho e relações de atividade técnica. Estes conceitos podem ser aplicados a determinadas máquinas, mas não é possível a expansão para o universo da produção industrial contemporânea, regida pelo mercado, ou pelo tipo de relação dos seres humanos com as máquinas, que raramente pode se qualificar como de "continuidade de invenção", a partir de uma relação de atividade técnica. Engenheiros, tecnólogos, técnicos e inventores civis são responsáveis pela invenção e aprimoramento de máquinas e tecnologias, mas nem todo usuário tem poder ou condições de interferir no processo industrial.
Quanto à gênese dos objetos técnicos, o conceito se aplica a poucos elementos técnicos, assim esta hipótese foi qualificada de "mística" após a análise de objetos técnicos industrializados realizada por cientistas, engenheiros e tecnólogos.
De acordo com Simondon deveria haver uma cultura das técnicas, como matéria ensinada na escola. Algumas faculdades de engenharia da França realizaram uma pesquisa com seus alunos, durante certo período de tempo, em que todos descreveram máquinas e objetos técnicos, analisaram seu funcionamento, fizeram desenhos, esquematizaram e formalizaram todos os instrumentos e máquinas que puderam. Chegaram à conclusão, após a pesquisa, de que seria impossível fazer isto como matéria, devido à enorme quantidade de máquinas e instrumentos que cercam os seres humanos. O tempo gasto para executar o trabalho não é compatível com o tempo de curso, pois há muito que aprender até o final com as matérias já existentes. Professores, cientistas e alunos chegaram à conclusão de que é melhor e mais proveitoso estudar e conhecer filosofia, processos e sistemas, de invenção, produção e de cultura geral, que os alunos podem aplicar a todos os objetos técnicos e máquinas.
No final do livro há discussão sobre os conceitos e as teorias de Simondon, se alguns aspectos foram criticados, como a gênese dos objetos técnicos e a aula de tecnologia, onde todos os objetos deveriam ser classificados e formalizados, com a intenção de integrar a cultura da técnica à cultura geral; por outro lado as teorias desenvolvidas por Simondon, a respeito do desenvolvimento e dos desdobramentos e fases do pensamento estão bem embasadas e são bem aceitas.
Os seres humanos estabelecem relações com o mundo por meio de fases (SIMONDON, 1989: 159) como a tecnicidade, a religião e a arte, em um sistema integrado complexo, sendo que as fases não podem existir independentemente ou isoladamente; convergem e se distanciam, ao se esgotar a energia, quando se distanciam; ou quando ele se satura, na convergência do sistema, ele se reconfigura e podem surgir novas fases.
Supõe-se que a tecnicidade resulte de uma defasagem de um jeito único, central e original de ser no mundo, o procedimento mágico; a fase que equilibra a tecnicidade é o da conduta religiosa. Ao ponto neutro, entre técnica e religião, aparece ao momento de desdobramento da unidade mágica primitiva o pensamento estético: ele não é mais uma fase, mas uma sensibilidade permanente da ruptura da unidade do procedimento mágico, e uma pesquisa da unidade futura. (SIMONDON, 1989:160).
A tecnicidade, ou seja, qualidade, condição ou caráter do que é técnico deriva do jeito mais primitivo do ser humano se colocar no mundo, por meio do pensamento mágico. É uma das fases que integram um sistema complexo que funciona segundo as relações mútuas de tensão e estabilidade, entre todas as fases. Simondon chama de pontos neutros, aqueles em que se encontram as verdades das fases, ou seja, lugares de equilíbrio do sistema. Do desdobramento da unidade mágica primitiva de ser no mundo, do ponto de verdade entre técnica e religião, surge o pensamento estético.
Ainda segundo o autor, cada uma das fases tem uma parte teórica e uma parte prática, como a arte, ou a religião; inclusive a tecnicidade se desdobra nestes termos.
O pensamento reflexivo, ou seja, as ciências e a razão, devem fundamentar a tecnologia.
É ainda da unidade mágica primitiva das relações do homem com o mundo que se deve partir para compreender a verdadeira relação das técnicas com as outras funções do pensamento humano; é por este exame que é possível apreender porque o pensamento filosófico deve realizar a integração da realidade das técnicas à cultura, que é possível identificando o significado da gênese das técnicas, pela fundação de uma tecnologia; então se atenuará a disparidade que existe entre técnicas e religião, nociva à intenção de síntese reflexiva do saber e da ética. A filosofia deve basear a tecnologia, que é o ecumenismo das técnicas, porque as ciências e a ética podem se reencontrar dentro da reflexão, temos que uma unidade das técnicas e uma unidade do pensamento religioso precedem o desdobramento de qualquer uma das formas de pensamento teórico e prático. (SIMONDON, 1989: 162).
A unidade mágica primitiva pode ser reconhecida, quando se observa o ser humano original, ao pintar cenas de caçada nas paredes das cavernas ao norte da França, durante o período glacial, por exemplo. Para realizar aquelas pinturas, estes seres lançavam mão de técnicas especializadas, entre as quais usavam soprar sobre a parede, os pigmentos que preparavam, para isto empregavam tubos vazados, com diferentes tamanhos de circunferência. Seu propósito era mágico, acreditavam que, ao representar os animais nas pinturas, eles poderiam ser abatidos, pois seus duplos já os substituíam no mundo.
domingo, 9 de novembro de 2008
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